quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Uma história de anorexia


Navegando em um dos sites que discutem a produção de sites, deparei-me com um artigo instigante sobre escrita para a web.
O site em questão é o A List Apart (Uma lista à parte), um site que uso como referência para pesquisa e para consulta, pois trata-se de uma revista eletrônica que apresenta artigos sobre os diversos aspectos da Internet como design, programação, conteúdos, escrita, etc. Vale a pena conhecer.
Já o artigo, Reviving Anorexic Web Writing, me pareceu uma provocação, um convite à leitura. O que a autora queria dizer com Revivendo a escrita anoréxica para web? Um título instigante, que despertou de imediato minha curiosidade. Foi então que notei, mesmo sendo webdesigner e não escritor, a primeira lição: títulos interessantes atraem os leitores. Pensei em como a criatividade pode ser um primeiro passo para a sedução do leitor. Pensei também em como a web está repleta de títulos clichês, em textos clichês, em sites clichês, com seu design bacana.
O artigo - que ainda pretendo traduzir um dia, quem sabe? - parte de uma situação vivida por Amber Simmons, escritora E webdesigner (para o site dela clique aqui). A autora descreve um caso em que um cliente em potencial aparece em seu escritório encomendando umo site. Ela diz "tudo bem, me dê os conteúdos que quer usar para que eu tenha uma noção a respeito daquilo com que estou lidando". O sujeito responde "Não podemos acrescentar isso depois que o design estiver pronto?". Diante da resposta, ela diz não ser possível desenvolver o trabalho.
Por ser escritora, além de designer, Simmons acredita que o coração de um site é seu conteúdo e que se as palavras não forem belas e significativas, o melhor design do mundo não será capaz de compensá-las.
A partir deste argumento a autora aponta para uma série de fatos históricos que contribuíram para o que ela chama de uma História da Anorexia. Entre muitos aspectos a autora destaca como o distanciamento entre designers e escritores fez com que muitas páginas fossem projetadas para serem olhadas, mas não lidas. Outra questão é que muitos dos textos escritos não eram feitos por escritores profissionais, mas por secretárias, engenheiros, designers. Nessa época, textos para a web eram simplesmente dolorosos para serem lidos: nem o design favorecia a leitura, nem o conteúdo valia a pena ser lido. A autora afirma que, como resultado dessas ações, os designers e escritores acabaram cultivando leitores impacientes e preguiçosos, levando ao conselho aos escritores para que abandonassem a arte da escrita e se preocupassem apenas em sumarizar.
Muito embora a situação tenha mudado (mais ainda nos EUA), embora designers e escritores tenham se aproximado nos projetos e escritores de qualidade tenham empregado seu talento em textos para a web, a recomendação de se cortar palavras, manter os textos curtos, em tópicos ainda prevalece. Na sequência a autora aponta para uma série de aspectos importantes, relativos à produção textual, em que a inserção do escritor profissional pode contribuir para oferecer uma experiência ainda melhor e mais rica na internet. Como exemplo, a autora destaca até o papel das legendas das imagens, que para a maioria não faz muita diferença, mas já para os cegos, na ausência de uma imagem, só contam com descrições simples, incompletas, e pouco criativas, que mal traduzem as imagens.
Particularmente, concordo com a autora. Penso que os sites devam oferecer mais do que informação, devam oferecer experiências que façam valer a pena. Não apenas os conteúdos visuais (por que não tratá-los como conteúdos?) mas também os verbais. Se o livro impresso tem seu design a partir do texto, por que o website deveria seguir o caminho contrário? Aliás, nem lá nem cá. Antes fosse que escritores e designers dialogassem mais, assim teríamos também livros impressos talvez muito mais ricos e interessantes.
Como diz Daniel Munduruku, escritor índio, "jogo aqui alguns piolhos para que vocês cocem suas cabeças".

5 comentários:

edna farias disse...

Muito intessante e redentor, Ricardo.

Como alguém que gosta de escrever, mas se sentia inadequada com relação à "escrita virtual", o texto postado por você me fez emitir um suspiro de alívio: ainda tenho chance.
Beijo.

AnaCris disse...

Muitos piolhos e muita coceira!
Os livros infantis são repletos de imagens (designers) e alguns com pouca ou nenhuma escrita. Os pequenos lêem através de imagem por não saber o novo código e interagem com o livro. Quando aprendemos o novo código - a escrita, desenvolvemos novas formas de interagir. O texto e as imagens comunicam a todo o tempo e se complementam... O que seria do livro "A Tecelã" sem as imagens dos tecidos, coloridos - um outro livro certamente. O interlocutor aquele que navega e busca uma interação de conteudos de si e do outro. É rápido e fulgáz...o titulo, a imagem, o designer tudo mobiliza para entrar na página, no texto e contexto. Esse comentário passou do limite prescrito, porém com tantos piolhos e coceira não podia ser diferente. Ana Cris

patricia disse...

Sou outra pós Jack e Ricardo. Aprendi a ler tudo em tudo. Isso é magnífico! Valeu Ricardo.

Luiz Favilla disse...

Maestro, recentemente finalizei um trabalho com um jovem diretor de arte. Passei dois dias tecendo um texto envolvente e sedutor.
Quase nos finalmentes, o gajo comentou: "não dá pra diminuir essa sua mancha gráfica?"
Se a praga que eu roguei pegar o menino deve estar se coçando até agora. Ora se.
Mancha gráfica é o cacête!
=)

Ricardo Artur disse...

Obrigado pelos comentários.
Edna, entre a web é sua.
Ana Cris, "A Moça Tecelã" é um caso exemplar da integração entre texto e imagem. Alterando algum dos elementos, já teríamos outro livro.
Patrícia, obrigado, aprendemos o tempo todo.
Luiz, o mundo profissional é repleto destas esquisitices.
Em tempo, aproveito para esclarecer que não é impertinência responder aos comentários.
A seção de comentários do blog também funciona como ponto de discussão acerca do texto apresentado. O autor também pode se manifestar.